Sou uma rua, uma flor, o vento que sopra e faz você sentir frio. Posso estar em qualquer lugar.
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Queria um chão de cimento, daqueles que ficam gelados ao amanhecer, por causa do orvalho, e também ao anoitecer, pelo frio que a noite traz. Um Ipê roxo para fazer sombra, uma casa pequena, cachorros e gatos, uma rua tranquila, um amor simples de lidar, como aquele algodão doce que derrete fácil na boca.
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
Dor segundo A.
Eu lembro da dor, lembro bem. Não porque ainda doa, não dói há algum tempo, mas porque foi tão forte e tão marcante que eu sempre vou ter aquele arrepio na pele ao lembrar de todas aquelas noites que passei escondida, no escuro, esperando que alguém arrancasse todo aquele sofrimento de mim, que me apunhalava lentamente enquanto eu derramava todas as lágrimas que conseguia produzir.
Sei que aquela não foi a primeira vez que eu senti uma perda, mas, por algum motivo, é a única vez que consigo lembrar do sofrimento. Talvez porque eu já fosse "velha" o bastante pra entender o que uma perda significa. Talvez porque eu já soubesse o peso que cada palavra carrega consigo e não conseguisse me livrar de nenhuma grama desse peso que eu insistia em sempre levar sobre meus ombros.
Meu rosto havia mudado, minha voz parecia mais grave e passei a carregar o celular como um órgão vital. A perspectiva de mundo que eu tinha acabou junto com todas as forças que eu usei para chorar e não morrer sem ar. Fiz novos amigos, grandes amigos, os melhores que alguém como eu poderia ter. Tanta coisa mudou... Mas se perguntassem, eu saberia dizer exatamente que parte de mim estava dolorida.
Aí eu conheci você e foi como uma bolsa de gelo para um joelho roxo. Eu podia respirar mais livre e agora já sorria. Te cuidei tanto, assim como você cuidou tanto de mim e mesmo assim te fiz mais triste do que feliz. E sinto muito por isso.
Hoje eu sei que toda aquela dor vai voltar, e tá bem perto, posso sentir seu cheiro. Isso porque eu não sei lidar com nada, não sei fazer as coisas do jeito que deveriam ser feitas e não mereço você. Eu não deveria fazer as coisas que faço e não deveria ser do jeito que sou, mas não consigo evitar. Um dia, sei que isso vai chegar a você e eu queria muito que você me perdoasse por ser assim. Sou fruto de muitos erros e sei que você não foi um deles, mas eu fui. Desculpa por não ser quem você achou que eu sempre fosse, desculpa por te esconder a verdade, desculpa por colocar tudo a perder, mas foi mais forte do que eu.
Sei que aquela não foi a primeira vez que eu senti uma perda, mas, por algum motivo, é a única vez que consigo lembrar do sofrimento. Talvez porque eu já fosse "velha" o bastante pra entender o que uma perda significa. Talvez porque eu já soubesse o peso que cada palavra carrega consigo e não conseguisse me livrar de nenhuma grama desse peso que eu insistia em sempre levar sobre meus ombros.
Meu rosto havia mudado, minha voz parecia mais grave e passei a carregar o celular como um órgão vital. A perspectiva de mundo que eu tinha acabou junto com todas as forças que eu usei para chorar e não morrer sem ar. Fiz novos amigos, grandes amigos, os melhores que alguém como eu poderia ter. Tanta coisa mudou... Mas se perguntassem, eu saberia dizer exatamente que parte de mim estava dolorida.
Aí eu conheci você e foi como uma bolsa de gelo para um joelho roxo. Eu podia respirar mais livre e agora já sorria. Te cuidei tanto, assim como você cuidou tanto de mim e mesmo assim te fiz mais triste do que feliz. E sinto muito por isso.
Hoje eu sei que toda aquela dor vai voltar, e tá bem perto, posso sentir seu cheiro. Isso porque eu não sei lidar com nada, não sei fazer as coisas do jeito que deveriam ser feitas e não mereço você. Eu não deveria fazer as coisas que faço e não deveria ser do jeito que sou, mas não consigo evitar. Um dia, sei que isso vai chegar a você e eu queria muito que você me perdoasse por ser assim. Sou fruto de muitos erros e sei que você não foi um deles, mas eu fui. Desculpa por não ser quem você achou que eu sempre fosse, desculpa por te esconder a verdade, desculpa por colocar tudo a perder, mas foi mais forte do que eu.
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Afonso e o labirinto
Tonto, tateou à procura dos óculos. Olhou as horas, desligou o despertador. Era o dia da terceira entrevista da semana. Levantou-se, fez um chá, regou o pé de tomate enquanto observava a poeira da cidade. Um lugar velho, com cheiro de fumaça e alguns prédios novos e exuberantes. Tomou o chá, depois um banho. Arrumou o cabelo e fez a barba. Ao abrir o guarda-roupas procurou pela camisa de botões nova e, ao vesti-la, percebeu que ela estava bem mais gasta do que nova.
Pegou um ônibus vago, pura sorte. Chegou ao escritório alguns minutos antes da hora marcada. Entrou em uma sala grande, com várias cadeiras acolchoadas e muitos rostos; nenhum conhecido. O relógio apontou 8:30 da manhã e uma mulher de meia idade com quadris largos abriu a porta da sala e adentrou-a, dando um sonoro "bom dia", logo em seguida.
Começou a ouvir histórias de cursos incompletos, uma gravidez precoce, alguns desempregados por falência e um número relativamente grande de inexperientes. Afonso estava começando a pensar em como diria, na frente de todos, que havia largado seus pais em uma pequena cidade para procurar por uma garota sem nome na capital. (O máximo que conseguira encontrar: um apartamento antigo e um pé de tomate na varanda).
Todos os seus documentos estavam organizados em uma pequena pasta marrom que jazia em seu colo. O frio da sala deixava suas mãos rígidas e ele começou a se perguntar se conseguiria desenrolar os dois barbantes que prendiam as duas abas da pasta.
A qualificação exigida para aquele cargo era mínima e, talvez, seu diploma da faculdade não fosse útil ali, mas isso não o preocupava; precisava apenas de um motivo para ficar. Em sua cidade, seria apenas mais uma cabeça, apenas mais um par de pernas compridas e apenas mais uma pessoa de cabelos castanhos, comum como a paisagem que cerca a todos naquele lugar.
A empresa estabeleceu um prazo de sete dias para convocar os aprovados. Afonso estava em seu apartamento, ouvindo uma música que dizia "se tu soubesse como machuca, não amaria mais ninguém", quando o telefone tocou. Ele agora era um homem empregado e deveria comparecer à sede da empresa às 8:00 da manhã da segunda. Era uma sexta e faziam 24 graus. "Se tu soubesse, não contaria pra ninguém."
Ele lembrava bem da garota. Olhos grandes, uma voz suave, cabelos ondulados. Ela entrou em um ônibus qualquer e ele partiu à sua procura. "Mas você nem sabe o nome dela!". Era verdade. Agora, pelo menos, poderia viver sozinho e tentar ter uma vida agitada na capital. (A garota nunca chegou à cidade, mas ele nunca soube disso).
Segunda-feira. Afonso. Terno. Começaria a trabalhar como assistente em uma média empresa, localizada no norte da cidade. Distribuiu "bons dias" e recebeu alguns de volta. Tomou um café e levou outro para seu chefe. Começou a trabalhar. Foi para casa às 6. Tomou um banho, jantou uma sopa, regou o pé de tomate, foi dormir. Terça, quarta, quinta, sexta. Bom dia, café, chefe, trabalho. Casa, banho, sopa, regar, dormir. Setembro, outubro, novembro. Bom dia, café, bajulação, trabalho. Apartamento, banheiro, jantar, pé de tomate, cama.
Livrou-se do marasmo de um lugar quieto, de pessoas e paisagens iguais. Perdeu-se em um labirinto cinza de M.D.F., onde todos bebem a mesma bebida, aspiram a mesma fumaça, vestem a mesma marca barata de terno e distribuem sempre o mesmo "bom dia".
Pegou um ônibus vago, pura sorte. Chegou ao escritório alguns minutos antes da hora marcada. Entrou em uma sala grande, com várias cadeiras acolchoadas e muitos rostos; nenhum conhecido. O relógio apontou 8:30 da manhã e uma mulher de meia idade com quadris largos abriu a porta da sala e adentrou-a, dando um sonoro "bom dia", logo em seguida.
Começou a ouvir histórias de cursos incompletos, uma gravidez precoce, alguns desempregados por falência e um número relativamente grande de inexperientes. Afonso estava começando a pensar em como diria, na frente de todos, que havia largado seus pais em uma pequena cidade para procurar por uma garota sem nome na capital. (O máximo que conseguira encontrar: um apartamento antigo e um pé de tomate na varanda).
Todos os seus documentos estavam organizados em uma pequena pasta marrom que jazia em seu colo. O frio da sala deixava suas mãos rígidas e ele começou a se perguntar se conseguiria desenrolar os dois barbantes que prendiam as duas abas da pasta.
A qualificação exigida para aquele cargo era mínima e, talvez, seu diploma da faculdade não fosse útil ali, mas isso não o preocupava; precisava apenas de um motivo para ficar. Em sua cidade, seria apenas mais uma cabeça, apenas mais um par de pernas compridas e apenas mais uma pessoa de cabelos castanhos, comum como a paisagem que cerca a todos naquele lugar.
A empresa estabeleceu um prazo de sete dias para convocar os aprovados. Afonso estava em seu apartamento, ouvindo uma música que dizia "se tu soubesse como machuca, não amaria mais ninguém", quando o telefone tocou. Ele agora era um homem empregado e deveria comparecer à sede da empresa às 8:00 da manhã da segunda. Era uma sexta e faziam 24 graus. "Se tu soubesse, não contaria pra ninguém."
Ele lembrava bem da garota. Olhos grandes, uma voz suave, cabelos ondulados. Ela entrou em um ônibus qualquer e ele partiu à sua procura. "Mas você nem sabe o nome dela!". Era verdade. Agora, pelo menos, poderia viver sozinho e tentar ter uma vida agitada na capital. (A garota nunca chegou à cidade, mas ele nunca soube disso).
Segunda-feira. Afonso. Terno. Começaria a trabalhar como assistente em uma média empresa, localizada no norte da cidade. Distribuiu "bons dias" e recebeu alguns de volta. Tomou um café e levou outro para seu chefe. Começou a trabalhar. Foi para casa às 6. Tomou um banho, jantou uma sopa, regou o pé de tomate, foi dormir. Terça, quarta, quinta, sexta. Bom dia, café, chefe, trabalho. Casa, banho, sopa, regar, dormir. Setembro, outubro, novembro. Bom dia, café, bajulação, trabalho. Apartamento, banheiro, jantar, pé de tomate, cama.
Livrou-se do marasmo de um lugar quieto, de pessoas e paisagens iguais. Perdeu-se em um labirinto cinza de M.D.F., onde todos bebem a mesma bebida, aspiram a mesma fumaça, vestem a mesma marca barata de terno e distribuem sempre o mesmo "bom dia".
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